Nosso professor BRUNO GOMES HOSP
- PI – Geografia, lotado na E. M. João Proença foi um dos vencedores do concurso
com a resenha do livro: ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA, José Saramago, Companhia
das Letras.
RESENHA
Talvez não o melhor ou mais
premiado livro de José Saramago, mas com certeza um dos mais famosos e
questionadores, “Ensaio Sobre a Cegueira” nos apresenta a história de um homem
que de repente fica cego, sem nenhum motivo plausível. Porém, não é uma
cegueira comum, negra, trata-se de uma cegueira branca (“como se tivesse caído
num mar de leite”), como se o excesso de luz, simbolizando a variedade enorme e
veloz de informação, típico de nosso tempo, tivesse-o cegado.
Com o decorrer da história,
percebe-se que, uma a uma, as pessoas passam a sofrer da mesma cegueira, até
chegar ao ponto de todos ficarem cegos; todos menos a mulher do médico que
atendeu o primeiro cego. Assim, a história começa a tomar forma, e a busca por
uma resposta àquela situação nos envolve no enredo do livro.
Entretanto, a cegueira é só o
pano de fundo para uma análise da sociedade e da natureza humana, que nos leva
a observar de perto as reações primitivas do ser humano diante a um mundo
caótico, sem leis, governos, lares, onde o pior da humanidade fica estampado,
sem pudores, através de situações vividas por um grupo de pessoas que inclui o
“primeiro cego”, a “mulher do primeiro cego”, o “médico” e a “mulher do médico”
(a única a enxergar), uma “rapariga de óculos escuros”, um „rapazinho
estrábico”, um “velho de venda preta” (que já era cego antes do acontecimento,
mas que teve sua cegueira “branqueada” como a dos outros) e um “cão de
lágrimas”.
A ausência de nomes é outro ponto
que chama atenção nessa obra de Saramago, os personagens são chamados como sua
primeira aparição os definiu, como se a primeira impressão fosse tão forte que
tivesse ficado embutida na forma de “enxergar o outro” (entre aspas, já que
eram cegos). Essa forma de caracterizar os personagens revela uma crítica forte
às conclusões e julgamentos precipitados que podemos fazer do outro logo ao conhecê-lo.
Dentre os vários pontos da trama,
destaca-se o fato da mulher do médico enxergar. Por que isso acontece? Seria
ela especial? Imune? Não há respostas para essas perguntas, talvez seja só mais
uma forma de Saramago exaltar as qualidades femininas, como sempre faz em suas
obras (sempre dedicadas à sua companheira Pilar); talvez pelo fato dela
apresentar uma personalidade mais humana, enxergar o mundo por uma ótica mais
compreensiva, inerte aos pudores e dogmas sociais. Isso não chega a ter
importância, o fato é que ela se torna a principal personagem da história,
sendo responsável por guiar o grupo e protegê-los dos perigos do mundo no qual
estão inseridos. Ela seria a consciência daquele mundo e, possivelmente, o
alter ego do autor, responsável pela narração e por nos conduzir junto aos
peregrinos cegos.
O título não se resume à tal
cegueira branca, o livro realmente faz um ensaio superficial sobre os tipos de
cegueiras, físicas ou não, mas nos remete a repararmos na mais comum e maléfica
das cegueiras, a cegueira imposta pela sociedade: uma barreira que não nos
permite enxergar o que realmente importa nas relações humanas e na maneira de
vermos o mundo. Barreira derrubada no decorrer da trama que nos deixa em xeque
a todo o momento conosco mesmo e nossas convicções, nos remetendo à frase que
define o livro: “Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara.” (José Saramago).
Nenhum comentário:
Postar um comentário